A força-tarefa do Ministério Público de Goiás (MP-GO), criada para investigar os casos de abuso sexual que teriam sido cometidos por João Teixeira de Faria, o médium João de Deus, recebeu nesta segunda-feira, 10, 40 contatos formais de vítimas. A Promotoria e a Polícia Civil começou a agendar os depoimentos das mulheres.
As conversas informais ouvidas até o momento pelo MP-GO indicam que a investigação terá como ponto central o abuso sexual. Mas, além disso, será avaliada também a prática de outros crimes. Nem Promotoria nem polícia informaram quais seriam os demais delitos
As duas instituições se preparam para a possibilidade de pedir o fechamento preventivo da Casa Dom Inácio de Loyola, onde os atendimentos são realizados.
"Temos ainda de avaliar os depoimentos que forem formalizados. Dependendo do que for constatado, essa hipótese não está descartada", afirmou o coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público de Goiás, Luciano Meireles.
A medida seria tomada para evitar a eventual prática de novos delitos.
As investigações agora serão feitas de forma simultânea pelo MP-GO e pela Polícia Civil, que também formou um grupo específico para a investigação. A polícia recebeu o contato de mais duas mulheres. Além disso, no fim de semana, foram registrados dois boletins de ocorrência contra o religioso.
Promotores afirmam ser indispensável que vítimas formalizem as denúncias. Além de depoimentos, serão usados como prova laudos psicólogicos. Meireles disse que, conforme o andamento da coleta de provas, casos semelhantes que já haviam sido arquivados poderão ser reabertos. A equipe já identificou um caso arquivado e um processo em que João de Deus recebeu acusação semelhante, mas foi absolvido (veja abaixo). O representante do MP-GO afirma que as penas, somadas, podem chegar a mais de 150 anos.
Para tornar mais ágil o processo de denúncia, o MP-GO criou um e-mail específico para receber relatos de vítimas: denuncias@mpgo.mp.br. Queixas feitos em outros Estados e até no exterior também serão registradas. Segundo Marcella Orçai, delegada de Goiás, isso poderá ser feito nas embaixadas.
No caso de vítimas em outros Estados, os depoimentos podem ser feitos diante da Polícia Civil ou Ministério Público das suas cidades. "No caso do MP, os relatos depois serão enviados para Goiás", disse Meireles. Em Minas, ao menos duas pessoas já fizeram denúncia, segundo a Promotoria local.
São Paulo
Ao menos 30 denúncias foram levadas ao MP paulista, segundo a promotora Maria Gabriela Manssur. Como as investigações só começaram agora, não é possível dizer se há duplicidade de relatos com as denúncias feitas ao MP de Goiás. Ela considera que o número de casos de abusos pode chegar a 200 no País, segundo relatos em grupos de vítimas. No Estado, quatro promotores vão atender as autoras das queixas.
Presidente do grupo Vítimas Unidas, criado por vítimas do ex-médico Roger Abdelmassih, Maria do Carmo dos Santos diz que as autoras de denuncias ainda estão sendo ameaçadas. "Muito mais vai aparecer." Segundo ela, vítimas e apoiadores se organizam para garantir que João de Deus seja punido, diferentemente do que ocorreu em outras acusações esparsas. Em paralelo, ativistas lançaram a hashtag #OprahWeNeedYou (Oprah, precisamos de você) para cobrar um posicionamento da apresentadora Oprah Winfrey, que retratou o médium em programas da TV americana . "Cadê o movimento 'Mexeu com uma, mexeu com todas'?"
A Federação Espírita Brasileira divulgou nota, dizendo que "o serviço espiritual não deve ocorrer isoladamente, apenas com a presença do médium e da pessoa assistida".
Defesa
O líder espiritual João de Deus passou a segunda-feira em São Paulo para se encontrar com seu advogado, Alberto Zacharias Toron. Segundo o defensor, um ofício foi encaminhado para o Ministério Público e outros seriam enviados para a Delegacia de Polícia e o Fórum de Abadiânia (GO), informando que João de Deus está à disposição para esclarecimentos. "Ele volta para Abadiânia para exercer o trabalho dele, ajudando as pessoas como vem fazendo nos últimos 40 anos", afirmou o criminalista.
Conforme o site de O Globo noticiou nesta segunda à noite, no documento protocolado na Justiça de Abadiânia, a defesa diz ter recebido "com indignação" as acusações. Assinado por Toron, o ofício registra que João de Deus "rechaça" o que classifica de "qualquer prática imprópria dos seus procedimentos", como havia dito em respostas enviadas à TV Globo A reportagem não conseguiu contato com a assessoria de imprensa do médium.
Outros inquéritos
O delegado-geral da Polícia Civil de Goiás, André Fernandes de Almeida, informou que o médium João de Deus, já respondia a quatro inquéritos anteriores por denúncias de assédio e abuso sexual. Ele disse que dois inquéritos foram instaurados em 2016 e outros dois foram abertos este ano, no mês de agosto. Ele confirmou que, em ao menos um dos inquéritos, o médium já foi ouvido.
Em 2010, uma ação foi aberta na comarca de Abadiânia pelo Ministério Público local. Segundo os autos, uma mulher relatou ter sofrido abuso sexual durante o "tratamento espiritual". O réu foi, contudo, considerado inocente, pois a vítima sofria de síndrome do pânico, o que não a permitiria "distinguir a fantasia da realidade" no que se refere às acusações, segundo o magistrado.
Marcella Orçai, delegada de Goiás, afirmou que dois processos, um de 2016 e outro aberto neste ano, "estão em estágio avançado e o desfecho deverá ocorrer em breve". Marcella atribuiu a demora na investigação dos dois casos à "complexidade" da investigação e também à resistência em uma das vítimas em continuar o inquérito. "Não é uma tarefa fácil. Há todo um trabalho de convencimento", disse.
Questionado se houve demora na investigação da Polícia Civil, Meireles foi cuidadoso: "É preciso antes analisar o que foi identificado nos inquéritos abertos."
União
Nesta segunda-feira, 10, Polícia Civil e Ministério Público se reuniram para definir a estratégia conjunta de trabalho. Nesta terça, dia 11, deve haver nova reunião. "A ideia é unir forças para que o caso seja elucidado da forma célere, ouvindo eventuais vítimas com a maior brevidade possível", disse o promotor Luciano Meireles. (As informações são do jornal O Estado de S. Paulo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário