Quando Lidia Karine Souza fala no telefone com seu filho de nove anos - durante os 20 minutos por semana que lhes são permitidos -, ele suplica à mãe para que faça todo o possível para tirá-lo da custódia do governo dos Estados Unidos e voltar para ela.
A brasileira de 27 anos, que busca asilo nos Estados Unidos, vem tentando se reunir com o menino com todas as forças. Ela fez buscas por Diogo durante duas semanas, desde que foram separados na fronteira com o México no fim de maio. Quando ela deixou uma prisão no Texas no dia 9 de junho, preencheu 40 páginas de documentos que os agentes americanos disseram ser necessários para recuperar a guarda do filho.
Então lhe disseram que as regras tinham mudado e que seria necessário que todos os membros da família dela que moram nos Estados fossem fichados. Mais documentos foram pedidos.
Não era a segurança que buscava para ela e o filho. Não era o sonho americano. "Isso... É um pesadelo", disse na quarta-feira, 27, em um hotel de um subúrbio de Chicago, ainda aguardando para se reencontrar com Diogo, de quem jamais havia se separado por mais de uma semana antes de chegar aos Estados Unidos.
No dia anterior, advogados de Souza ingressaram com uma ação contra a gestão Trump para solicitar a imediata liberação da criança. Diogo está há quatro semanas em um abrigo contratado pelo governo em Chicago. Passa a maior parte do tempo sozinho, em quarentena por causa da catapora que contraiu. Ele passou seu nono aniversário sem a mãe.
Os advogados de Souza disseram que vão comparecer a uma audiência de emergência nesta quinta-feira, 28, em um tribunal em Chicago, apesar de uma ordem de um juiz federal, emitida dois dias antes, obrigar o governo a devolver mais de 2 mil crianças de imigrantes ao convívio de suas famílias em um prazo de 30 dias - ou 14 dias, no caso de crianças de menores de cinco anos.
O advogado Jesse Bless, de um escritório de Boston especializado em imigração e que é um dos representantes legais da brasileira, disse não ter se empolgado com a decisão judicial, já que ela poderá fazer com que o governo adie os procedimentos ainda mais. "Temos dificuldade em ter confiança a essa altura", disse.
Por dias e semanas, alguns das centenas de pais separados de seus filhos na fronteira com o México pela gestão Trump têm enfrentado um dos mais complexos sistemas de imigração do mundo para conseguir reunir suas famílias.
Para muitos, tem sido uma luta desigual, frustrante e dolorosa. A maioria não fala inglês. Muitos não têm nenhuma informação sobre o paradeiro das crianças. Outros tantos dizem que as ligações para a central de informações do governo não têm sido atendidas.
Também há enormes desafios logísticos, e dúvidas sobre as confusas e descoordenadas práticas do governo americano. O Departamento de Justiça e o Departamento de Saúde e Serviços Humanos, responsáveis pela guarda das crianças, ainda não informaram de que forma pretendem cumprir a decisão judicial.
O diretor da União Americana das Liberdades Civis, Anthony Romero, disse que o prazo estipulado pelo juiz para a reunificação das famílias é realista. "É uma questão de vontade política, não de falta de recursos."
Dentre os fatores complicadores está o fato de que as crianças foram enviadas para abrigos em vários pontos dos Estados Unidos, a milhares de quilômetros da fronteira. Além disso, centenas de pais e mães já devem ter sido deportados sem os filhos.
A guatemalteca Elsa Johana Ortiz foi mandada de volta para casa sem o filho de oito anos, o que a obrigou a contratar um advogado americano. Ela mora em uma casa de tijolos aparentes nos arrabaldes da Cidade da Guatemala. "Enquanto ele não estiver comigo, não estarei em paz".
Em El Paso, no Texas, 36 pais e mães libertados no domingo de um centro de detenção iniciaram uma febril busca por seus filhos, utilizando uma única linha telefônica emprestada por uma organização beneficente.
Muitos deixaram o Texas em direção a Nova York, Dallas ou cidades da Costa Oeste para viver com outros membros da família, na esperança de que estabelecer residência facilite o retorno dos filhos. Muitos partiram apenas com sanduíches, certidões de nascimento e documentos do asilo em sacolas de compra.
Um desses imigrantes, o hondurenho Wilson Romero, de 26 anos, partiu de El Paso para a Califórnia, onde sua mãe se estabeleceu recentemente. Ele é pai de Nataly, de 5 anos, que, assim como o brasileiro Diogo, contraiu catapora no abrigo onde está desde maio.
Em Honduras, Romero trabalhava em uma fábrica têxtil que produz logotipos para marcas americanas. Ele disse ter deixado San Pedro Sula - uma das cidades mais violentas da América Latina - para que Nataly tivesse melhores oportunidades profissionais. Agora, só quer tê-la de volta. "Rezo a Deus para que seja logo", disse Romero, que tem uma tatuagem com o nome da menina no braço direito.
A brasileira Lidia Souza também tem uma tatuagem com o nome de Diogo no pulso. O advogado dela, Jesse Bless, disse que o governo americano também está pedindo a imigrantes que querem que seus filhos se estabeleçam com parentes ou amigos nos Estados Unidos documentos como contas de luz ou contratos de aluguel - o que muitos que chegaram recentemente não têm.
Souza pediu asilo aos Estados Unidos alegando ter a vida em risco no Brasil. "Vim por necessidade", afirmou. Depois que Diogo foi levado, ela não fazia ideia de onde ele estava, até que outra mãe imigrante disse ter ouvido falar de um garoto com esse nome em um abrigo em Chicago. Desde então, ela fala com o menino durante 20 minutos por semana, ao telefone. Agentes do governo lhe disseram que a liberação da criança deverá ocorrer no fim de julho. Ela tem esperança, no entanto, de que a ação judicial abrevie a espera.
A brasileira, que se mudou para a casa de parentes nos arredores de Boston, visitou Diogo pela primeira na terça-feira, 26. Eles se abraçaram, e ela o beijou diversas vezes na cabeça e no rosto Os dois choraram. "Eu estava com muita saudades de você", ela disse. Diogo afirmou estar "melhor agora", ao ser perguntado como estava se sentido. A visita durou uma hora. Depois o menino retornou para a custódia do governo americano. "Ele chorou muito na hora de dizer tchau", disse a mãe. "Ele pensou que ia para casa com a gente." (As informações do Estadão)
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