quarta-feira, 27 de abril de 2016

CASOS DE AMEAÇA E PERSEGUIÇÃO VIRAM PESADELO DE MOTORISTAS DO UBER EM SALVADOR

É quase um guia rápido e prático de como montar uma emboscada contra um motorista do Uber. O áudio está rolando nos grupos de WhatsApp de motoristas dos dois lados. O taxista, revoltado, ensina como atrair um concorrente até determinado local. E aí? Aí, como disse o próprio: “pau!”. “Todos os taxistas de Salvador deviam fazer o cadastramento no Uber como cliente. Pediu táxi, pau! Da ‘última forma’. Daí sempre da ‘última forma’. Chegava um dia que ele ia cair fora”, sugere a gravação, atribuída a um taxista.

Se a tática é usada com frequência, ainda não se sabe, mas pipocaram relatos de ameaças e perseguições feitos por motoristas do serviço, após uma turista carioca descrever momentos de terror, no Rio Vermelho, quando o Uber em que ela estava foi cercado por taxistas. “Batia nos vidros e gritava que dali nós não passaríamos. Contei uns 15 taxistas”, relatou ela no Facebook.

A mulher foi parar na delegacia e o veículo Uber no pátio da Transalvador. Nesta terça (26), o motorista disse que ainda não havia recuperado o carro. “E quando recuperar, só volto a rodar quando a polêmica se resolver”, garantiu o uber. Depois disso, o CORREIO ouviu outros relatos de condutores que foram perseguidos, ameaçados e xingados por taxistas, que, ao que tudo indica, iniciaram uma cruzada contra o serviço.

Trauma - Os motoristas pedem para não ser identificados e afirmam que o clima é de medo. Muitos pararam de circular até que uma decisão judicial os favoreça. Um deles foi ameaçado no sábado, na primeira vez que ligou o app. Quatro jovens que saíam de uma festa fizeram um chamado no Rio Vermelho. Iam para um hotel na Pituba. “Eles eram de fora, tinham um sotaque do Sul”, contou o uber.

Passava de meia-noite e ele parou na Rua Conselheiro Pedro Luís, próximo à boate Zen. Quando os passageiros entravam no veículo, conta, taxistas se aproximaram. “Eles vinham ‘abafar’ e eu pedi que o pessoal adiantasse o passo. Foi o tempo de eu arrastar o carro. Mas eles ainda xingaram e bateram na porta e no vidro”. Daí em diante, o motorista não ficou mais à disposição. “Desliguei. Não uso enquanto não for criada uma regulamentação. Os taxistas estão tratando a gente como delinquentes”, disse.

Danificado - Também no sábado, outro motorista diz que foi ameaçado e teve o carro danificado no Largo dos Aflitos. “Sofri uma agressão verbal e um taxista babaca deu um murro no lado do carro e amassou um pouco, mas já reparei o dano”. O curioso é que os próprios taxistas gravaram vídeos das ações e compartilharam nas redes sociais.

Em um deles, um Gol branco é cercado e impedido de seguir em frente, também no Rio Vermelho. “Olha o Ubi (sic). Olha o Ubi ativo aqui em Salvador. Ói a placa do Ubi, ói! Chama a polícia, chama a polícia”, avisa um taxista, numa gravação. Nesse momento, uma passageira desce do carro e reivindica o direito de usar o serviço. “Eu tenho o direito de ir e vir”, grita. “Mas é proibido. Você tá errada. Você e ele”, dizem os taxistas.

Tática - Há relatos de ubers que confirmam a tática de emboscada através do cadastramento falso. “Os taxistas usam o aplicativo para fazer uma chamada falsa para fazer o motorista se deslocar até um determinado local. Já recebi várias chamadas assim”, conta um uber. “Estava na Vasco da Gama e recebi um chamado do Largo da Mariquita. Aí, quando cheguei lá e liguei para o cliente, não atendia. Quando percebi que tinham taxistas reunidos, fiz o retorno e fui embora. Cancelei a viagem”, contou outro.

“O pessoal tá com medo. Tanto motoristas quanto usuários. Muitos preferem sair só quando surgir uma liminar. As autoridades estão esperando acontecer alguma coisa grave”, diz o uber Oscar Guedes, 40. Por conta da perseguição, além do medo da fiscalização, ubers começaram a desenvolver estratégias para driblar os problemas. Uma delas é orientar passageiros a fazer chamados em locais afastados de pontos de táxi. Outra é pedir para sentar no banco da frente.

Emergência - Em nota, o Uber informou que orienta seus motoristas “para que não se envolvam em brigas e discussões”. “Para assessorá-los, criamos um número de telefone 0800, de emergência, que aciona a polícia”. A empresa informou ainda que os motoristas possuem uma apólice de seguro com cobertura a partir de R$ 50 mil por passageiro.

Presidente da Associação Metropolitana de Taxistas, Valdeilson Miguel disse que a entidade não orienta que taxistas atuem com violência, mas entende que o Uber é uma “concorrência desleal”. “O taxista é pai de família, tem suas contas para pagar e não aceita de forma nenhuma a deslealdade que esse aplicativo impõe”, declarou.

Quadrilha - Para o delegado Adailton Adan, titular da 1ª Delegacia (Barris), a cruzada dos taxistas ao Uber pode ser considerada formação de quadrilha. “Se há mais de três pessoas utilizando para a prática de violência, isso é crime e tem que ser apurado pela polícia”, disse. O advogado criminalista Domingos Arjones concorda com o delegado e também destaca que “a situação pode evoluir de ameaça para crimes como lesão corporal, tentativa de homicídio”.

Titular da 7ª Delegacia (Rio Vermelho), a delegada Jussara Santos tem opinião contrária. Ela entende que se trata de “um fato relativo para pressionar a prefeitura”. “Não é um crime organizado, com a finalidade de praticar crime grave. Seria mais uma mobilização, como forma de pressão social”, defendeu. A assessoria da Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que qualquer atitude criminosa cometida contra motorista do Uber será investigada. A Polícia Civil disse não ter um balanço sobre os ataques.

Motorista foi espancado em emboscada - A tensão entre taxistas que não aceitam a concorrência do Uber e os motoristas que prestam este tipo de serviço já motivou ameaças e agressões em outras cidades onde o serviço já está disponível. Em Porto Alegre, por exemplo, um motorista do Uber foi agredido por taxistas dentro do estacionamento de um supermercado, em novembro.

Bráulio Pelegrini Escobar, 40 anos, levou socos e pontapés por cerca de dez minutos até ser socorrido por testemunhas e chegou a ser hospitalizado. Dois taxistas foram presos em flagrante pelo ataque. Há casos de violência também nas outras oito cidades (além de Salvador e Porto Alegre) onde o serviço já opera no Brasil. No último final de semana, três veículos do Uber foram apedrejados em diferentes pontos de Belo Horizonte. Segundo a PM, as agressões partiram de taxistas. Em todas as ocorrências, os veículos tiveram vidros danificados por pedras. (As informações do Correio)

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